quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

A problemática do Asana

Uma das grandes críticas que se fazem ao método de Ashtanga Yoga, segundo a tradição de Sri. K. Pattabhi Jois e Sharath Jois, é o envase excessivo à prática do Asana (postura de yoga). No ocidente, a prática de yoga está muito associada à prática do asana, e apesar de muitos saberem que o yoga vai muito para além da componente física, do alongamento e correcção da postura, poucos são os que realmente o compreendem. Patanjalim definiu o Yoga como a “ciência” que tem o objectivo de parar as flutuações da mente, e para Patanjalim, oito são os passos e etapas (Ashtanga) que devemos praticar para atingir a derradeira libertação. Asana é o terceiro passo/etapa.

Num mundo extremamente mental como o que vivemos, onde o processo de pensar é um vicio incontrolável, sentar e contemplar a vida parece uma piada de mau gosto, que no mínimo cria ainda mais ansiedade. A mente quer-se activa, e o corpo calado e “desligado” para que não atrapalhe a produtividade, e que funcione como uma máquina ao serviço do capital. E assim, o fenómeno mente-corpo cliva-se e deixa de ser um só. Estamos desligados do corpo, estamos desligados dos sentimentos e das emoções, estamos desligados da vida! Porque sentir não é produtivo!...essa é a verdade. E é aqui que começamos a nossa prática de yoga, no asana, na postura.

Começamos com o asana, pois é a parte mais palpável do nosso Ser, é aquela que mais facilmente conseguimos começar a trabalhar. E começamos bem e em grande! Trabalhamos a força muscular, a flexibilidade e o alinhamento. Suamos por todos os poros com o objectivo de transpirar e iniciar o processo de purificação e limpeza do corpo, pois desejamos um corpo são e uma mente sã. E logo assim, na primeira prática sentimos verdadeiramente consciência corporal, consciência do corpo e dos tecidos que o compõe. Mas o processo da consciência corporal vai muito além das meras dores musculares evidentes nos primeiros dias de prática.

No nosso corpo guardamos crenças e emoções de estimação de tempos remotos. Com o tempo fomos ficando programados para sobreviver, para não sentir, e nesse processo fomos reprimindo e negando certas partes de nós. Tristezas, fúrias, medos e desejos que não podiam ser expressos, que tiverem de ficar guardados em cantos escuros do corpo e da alma. Criamos culpas e vergonhas que nos castram e não nos permitem ser livres e felizes, tudo em prol do bem do pai, da mãe, dos avós e dos vizinhos, e da infelicidade do próprio. E no corpo vão-se acumulando as tensões, os bloqueios, daquilo que não pode ser dito, daquilo que não pode ser sentido, daquilo que não pode ser assumido e aceite.

Não nos sentimos ligados a nós e aos outros porque estamos tensos. Porque criamos mascaras socialmente aceites e bonitas, devido a crenças, ideias e imagens que achamos não serem dignas, bloqueamo-nos e limitamo-nos, guardamos essas monstros no fundo da alma, do corpo, da mente. O que não sabemos é que esses fantasmas, esses espíritos mortos, esses sentimentos não expressos, dia-a-dia nos conduzem, boicotam os nossos sonhos, prendem-nos as asas, e não nos permitem vislumbrar o paraíso. Sem nos apercebermos, levamos uma vida assim...sem vida, sem consciência, guiados por algo que nem sabemos o que é, automáticos...

Sim! Começamos pela prática do asana, pois há muito que descobrir. Não podemos ser felizes, livres, quem somos,...se não resgatarmos essas partes que foram negadas, que foram castradas e reprimidas. Temos de ir ao corpo, temos de ir aos músculos, às vísceras e tirar de lá o pó. Tirar a tensão, tirar os bloqueios. Temos de nos abraçar, perceber que somos corpo, que temos limites, que somos humanos. Temos de arrumar a casa e criar espaço, temos de respirar ar puro. E como mente e corpo são um só, ao trabalharmos o corpo, também estamos a trabalhar a mente, e para os unir, para nos unir-mos, e tornarmo-nos um só, respiramos. Mas esse, será outro post...;))

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